quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Retornos

Eu voltarei meu amor... Com essas palavras deixei a estação embarcado no trem, rumo ao batalhão.Não que eu quisera partir, mas estávamos em guerra e eu havia feito um juramento de defender meu país. Aqui é bem diferente de minha terra. O vento corta meu rosto ao invés de aliviar o calor, meus amigos de ontem são a contagem de mortos hoje, muitos enlouqueceram por causa das atrocidades vista aqui, muitas nem sequer lembram em que dia estamos, mas eu lembro.
A comida maravilhosa que minha mãe fazia, hoje, virou algo que nem consigo distinguir se está vivo ou morto. Como sinto saudade dela, dos carinhos e o conforto que ela me proporcionava arrumando minha cama. Aqui não temos camas somente trincheiras cheias de terra e ao invés de travesseiros temos armas.
As longas conversas e sermões que tinha com meu pai, hoje são instruções de guerras e sobrevivência passadas pelo meu capitão.
Lembranças como essas me mantém vivo, mas o que me aquece e faz o coração bater é ela, minha amada.
Quando raramente bate uma brisa leve, sinto o cheiro dos seus cabelos e o calor do seu corpo, ao fechar os olhos vejo o reflexo dourados do sol em seus cabelos loiros, seu sorriso iluminando um caminho escuro que eu seguia e seus olhos de um azul tão profundo que se comparam ao oceano.
Meus pensamentos são interrompidos por rajadas de metralhadoras, os inimigos estão vindo. ”inimigos”, não são inimigos são apenas jovens como eu, forçados a guerrear enquanto senhores em uma sala movem peças brincando de Deuses. Nós somos mais vitimas que soldados.
Um estrondo e uma bomba armada é jogada dentro do nosso pelotão. Alguns se salvaram porem dois soldados foram atingidos e estavam desprotegidos perto da bomba.
Ninguém se atreveu a ir buscá-los , mas do mesmo modo que eu sentia falta de tudo que eu tinha, imaginei quais seriam suas próprias historias. Eu tinha que salva-los, não os deixaria para trás. Busquei o primeiro carregando até um ponto seguro, mas, quando voltei pelo segundo percebi que a bomba iria explodir e joguei-me sobre ele ao chão para proteger seu corpo da explosão, algo me acertou a face e eu desmaiei.

Não sei quanto tempo se passou, somente sei que estou em um hospital. Todos os dias o doutor passa para perguntar como tenho me sentido, mas acima de tudo me esqueço de mim e vivo a perguntar dos dois jovens.
Felizmente recebo a noticia de que os dois passam bem, sinto com isso uma ponta de felicidade, mas ainda falta algo, faltava tudo o que um homem necessita o carinho daqueles que amo. “Nunca, mas voltarei” eu pensava.
A venda que cobre meus olhos são grossas e também questiono se algum dia voltarei a enxergar, mas a dor era tamanha que nem ao menos os olhos do meu coração viam a esperança ao longe.
Em certo momento penso ter ouvido uma voz conhecida, mas deve ser bobagem de uma mente já cansada.
Chega o doutor dizendo que já era o dia de arrancar as ataduras, “será que enxergarei?” minha cabeça não para um minuto, pronto, uma única venda e o medico fala “abra os olhos devagar”. Tudo estava claro, meus olhos arderam, mas com o tempo acostumou-se ao ambiente, no canto de minha maca estavam às vozes conhecidas, meus pais, que vieram para me levar pra casa. A emoção era tanta que mal consigo falar, olhos lacrimejam, eu estava novamente em casa.
Uma festa me esperava, repleta de amigos e parentes, mas faltava alguém.
No meio de todos surge ela com os mesmos cabelos e o mesmo maravilhoso sorriso que me manteve vivo por um longo tempo, e com uma criança com as mesmas características de aproximadamente 3 anos. “Ela se casou”, imagino, mas ao chegar a minha frente ela diz: ”filha conheça o papai” e ganho um abraço. Abraçando-me explica que quando parti estava grávida, mas soube somente semanas após eu ter ido à guerra. Sim aquela menina era minha filha e eu havia reconquistado meu mundo. E, ao me beijar, disse ao meu ouvido:” amor como é bom ter-te de volta”.